março 21, 2007

História do Dia - "Da erva à árvore"


"Da erva à árvore", de António Torrado


Eram dunas e dunas, a perder de vista. Montes de areia para o vento brincar...
Hoje, fazia uma duna maior aqui, amanhã apagava-a, para fazê-la mais além e, sempre segundo os seus caprichos, onde estavam montes, cavava vales, onde estavam vales, amoldava montes. O vento era uma vassoura enorme.
Cabeleiras dóceis de ervinhas rasteiras deixavam-se pentear, despentear, ao sabor do vento gigante. Ele é que mandava.


Uma delas, à beira de um tojo só picos, cresceu. Delgadinha que era arriscou-se à vida. Rompera a areia e apontava para cima. Ela lá sabia.
De dentes a ranger, o vento passou. Partiu-se o tronquinho? Não se partiu.
Senhor daquelas dunas, o que ele queria era disciplina, ordem, submissão. A erva, que erva afinal não era, submetia-se. Óptimo.


Foi crescendo e o vento sem dar por ela. Era um tronco já, uma árvorezinha de Natal para casa de bonecas. Outras ervinhas como, dantes, ela tinha sido, despontavam também, na mesma duna.Fincava as raízes, segurava-se com toda a força e, quando o vento descia, inc
Ali havia uma pequena nação de pinheiros novos. A ordem era: persis
Nada conseguiu. Os pinheiros sabiam que eram pinheiros.
O maior, o chefe, o mais velho, que da erva se fez tronco, do tronco se fez árvore, comandava a defesa e dizia aos mais novos, nas alturas em que o vento lhes fazia ranger os ramos: "Aguentem, que já passámos por pior". Eles aguentavam.
E foi assim que o vento, o gigante caprichoso que dantes arrasava dunas, teve de deixar de fazer castelos na areia.

Tinham raça e coragem para fazer frente ao vento.
Uns e outros, os maiores e os mais pequenos, começaram a olhar para a sombra. Alastravam para outras dunas. Guerreiros chamavam por outros guerreiros e desafiavam o vento. "Nada podes contra nós", gritavam-lhe.tir. Por enquanto, persistir. Resistir, seria para depois. E foram vingando.


Quando o vento deu por eles, teve uma grande cólera e soprou, dias a fio, sobre a duna, donde nascia, miudamente, frágil ainda, um sinal de rebeldia ao seu poderlinava-se à vontade dele. Tinha de ser assim.


Nota: consultem o site: www.historiadodia.pt, e todos os dias podem ler e saborear uma história diferente.
Lá se foi aguentando. O vento, a princípio, nem dava por ela. Era uma erva como as outras.

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